A meditação no Budismo Chinês

 

Moralidade e Meditação

A meditação não deve ser vista como prática isolada ou autônoma. Para ser eficaz, deve ser praticada em conjunto com a moralidade e a sabedoria. Sem um firme alicerce moral, a meditação nunca irá gerar os frutos maravilhosos que poderia dar. Sem sabedoria, mesmo que a prática produza bons resultados, estes não poderão ser inteiramente utilizados ou compreendidos pelo praticante.

 

De fato, a meditação faz parte do conjunto das práticas budistas. Portanto, é fundamental que os budistas meditem, mas quem não observar os preceitos budistas e não se esforçar para progredir em sabedoria provavelmente não colherá da meditação bons frutos.

 

No budismo, damos a moralidade, meditação e sabedoria o nome de “três treinamentos” (trini shikshani). Eles aparecem agrupados desse modo, como se fossem um todo, por ser essencial que sejam os três praticados simultaneamente.

 

O texto Coleção de Termos Utilizados em Tradução define: “Cessar o mal denomina-se moralidade. Contemplar a respiração, em perfeita paz, denomina-se meditação. Sobrepujar o mal para compreender a verdade denomina-se sabedoria.”

 

Por vezes, os três treinamentos são também chamados de “três treinamentos sem transbordamento”. “Transbordamento” significa pensamento ou comportamento que desencadeia envolvimento cármico. Transbordamentos são imperfeições que nos aprisionam na ilusão. Quanto menos transbordamentos tivermos, menos iludidos seremos. O budismo tem entre suas principais metas a eliminação de todos os transbordamentos, os quais resultam de ganância, raiva, ignorância ou de uma combinação deles. Desde tempos imemoriais e por incontáveis encarnações, nós nos deixamos agrilhoar por esses sentimentos: ganância, raiva e ignorância.

 

O Buda Shakyamuni ensinou os três treinamentos com o propósito de nos libertar da ilusão. Pela moralidade, controlamos os transbordamentos; pela meditação, aprendemos a encontrar a paz; pela sabedoria, aprendemos a utilizar nossos ganhos com o máximo de eficácia. De forma geral, a meditação fundamenta-se na moralidade, ao passo que a sabedoria se baseia na meditação.

 

Nos sutras budistas, os três treinamentos costumam ser qualificados de “triunfantes” ou “superiores”, porque superam a ilusão. São assim denominados também devido ao seu grande poder de nos conduzir ao nirvana. A prática diligente e sincera dos três treinamentos só pode ter como efeito nos trazer o maior dos méritos. Eles são “superiores” porque não podem levar ao erro. Assim sendo, acabarão inevitavelmente nos conduzindo à “triunfante” libertação da ilusão.

 

De acordo com o Sutra dos Estágios do Bodhisattva, o primeiro dos três treinamentos (moralidade), corresponde às paramitas da generosidade, da moralidade, da paciência e da diligência; o segundo treinamento (meditação), corresponde à paramita da meditação; o terceiro treinamento (sabedoria) corresponde ao paramita da sabedoria.

 

Os três treinamentos são fundamentais no budismo, pois todas as práticas budistas neles se alicerçam.

 

 

MORALIDADE

 

O controle da mente é a base da moralidade. 
O samádi depende da moralidade e a sabedoria depende do samádi.

Sutra Shurangama

 

Importância da moralidade

A palavra do sânscrito para moralidade é shila, que significa “preceitos” ou “obrigações”. O código moral seguido por monges e monjas budistas é chamado pratimoksha em sânscrito.

 

Naturalmente, os budistas leigos devem se preocupar mais com shila, embora seja útil que todos possam ter também uma noção de pratimoksha, que significa “redenção” ou “absolvição” e compreende as 250 regras que regem a vida dos monges e as 348 regras que regem a vida das monjas budistas.

 

Vinaya em Quatro Partes diz: “Pratimoksha significa controle. Alcançará o samádi quem seguir corretamente todas as regras de comportamento monástico, incluindo aquelas de convivência com os demais, de comportamento básico e outros bons darmas.” O samádi é um profundo estado de concentração meditativa. Esse trecho nos diz que a contenção moral é fundamental para as práticas mais avançadas. Sem cuidadosa observância das regras morais, impossível chegar ao samádi ou conquistar a sabedoria.

 

 

Originalmente publicado no livro Purificando a Mente – A meditação no Budismo Chinês,
Venerável Mestre Hsing Yün, Editora de Cultura, São Paulo, maio de 2004.